sáb, 23 de novembro de 2024

Variedades Digital | 16 e 17.11.24

ABIGEATO NA FRONTEIRA

“Em regra, são brasileiros furtando de brasileiros, vendendo para brasileiros, com suporte logístico de outros brasileiros e depositando a autoria na conta de uruguaios”
(Foto: Matias Moura/AP )

Confira a entrevista do Jornal A Plateia com o  titular da DRACO, delegado Adriano de Jesus Linhares Rodrigues, que anos atrás chefiou, em 2016, a Força-Tarefa de Combate ao Abigeato e Crimes Rurais no Estado do Rio Grande do Sul, que virou política pública de estado com a criação das DECRABs.

Naquele ano de atuação da Força-Tarefa, houve uma queda de registro de ocorrências na ordem de 27%. Foram realizadas prisões por furto de animais, roubos, associação criminosa, em todo o interior estado, e também na região metropolitana. Foram 17 organizações criminosas desarticuladas, 135 criminosos presos e mais de 800 animais recuperados, além das armas e veículos apreendidos. Linhares é delegado desde 2010. 

AP – Delegado, Sant’Ana do Livramento é o segundo maior município do RS e tem o segundo maior rebanho bovino, e o maior rebanho ovino. A atividade pecuária é fundamental para a economia local e possui 5 mil propriedades rurais, além de ter uma grande extensão territorial. Qual é o tamanho do desafio da DRACO em investigar os crimes praticados no interior do município? 

– Delegado Adriano Linhares – Pela dimensão territorial e especificidade de ser região de fronteira os desafios serão um pouco maiores. Mas nada que não se possa alcançar esclarecimento. Parafraseando o filósofo: “Não renunciamos a salvar o navio na tempestade só porque não saberíamos impedir o vento de soprar”, ou seja, não vamos deixar de fazer nosso trabalho por conta da extensão territorial, das condições geográficas de fronteira ou pela miséria moral individual. 

AP- O Jornal A Plateia tem acompanhado a pauta do abigeato há vários anos em Livramento, e, notadamente, de um tempo para cá, o volume de animais furtados tem aumentado, tanto nos bovinos quanto nos ovinos. Há casos de produtores “visitados” mais de cinco vezes neste ano. Isso se configura como atuação de organização criminosa, visto que é necessária uma grande logística?

Delegado Adriano Linhares – É possível que alguns fatos suportem uma organização criminosa. Contudo, também ocorre uma estrutura restrita a pessoas que acreditam na impunidade e subtraem ou facilitam a subtração de animais do próprio empregador ou de um amigo. Com isso, conseguem destinar os bens subtraídos a terceiros que não participam daquele enredo criminoso.  É comum em nossas investigações encontrarmos desavisados que matam o próprio cavalo que os carrega. 

AP – Pela sua experiência profissional, grupos criminosos urbanos como facções, podem estar envolvidos nestes casos?  

Delegado Adriano Linhares – Sim! Quando se trata de ser humano e imoralidade tudo é possível. Embora não seja regra. 

AP – No mês de setembro o Jornal A Plateia e o programa Fantástico da Rede Globo veicularam reportagem especial sobre a atuação de criminosos na região da fronteira, inclusive com imagens de câmera de segurança que registraram a tentativa de furto onde aparecem quatro pessoas. Estes criminosos já foram identificados. O que se sabe sobre o caso até agora?  

Delegado Adriano Linhares – Alguns se alcançou a identificação, precisamente dois do grupo. Estamos desenvolvendo trabalho nessa forma de atuação criminosa. 

AP – Livramento possui mais de 240 km de fronteira seca com o Uruguai, como será a atuação da DRACO com a Polícia uruguaia neste sentido e o rastreio da ação dos criminosos?

Delegado Adriano Linhares – Guardamos bom relacionamento com a polícia do Uruguai. Aquele país possui um contingente policial bastante preparado, muito receptivo e sempre atendeu imediatamente nossa demanda, quando solicitada. 

AP – Pela sua experiência, qual ou quais são os caminhos desses animais furtados, uma vez que comprovadamente são grandes lotes levados das propriedades? 

Delegado Adriano Linhares – No ano de 2016, atuamos numa força-tarefa investigando furtos de gado no RS e chegamos a fazer prisões aqui, em Sant’Ana do Livramento, de quadrilhas da região metropolitana. Assim como prendemos em Pelotas furtadores que vinham fazer abates de animais em Sant’Ana do Livramento. Há também os criminosos da região que furtam dos amigos, vizinhos, conhecidos ou desafetos e vendem para outras regiões. Todavia, cortam arames para direcionar as investigações ao país vizinho. E, em proporção menor, pode ocorrer algum furto que passa a fronteira. Mas em regra são brasileiros furtando de brasileiros, vendendo para brasileiros com suporte logístico de outros brasileiros e depositando autoria na conta de uruguaios.

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