Que a atividade de motorista profissional, em sua maioria das vezes, é totalmente desgastante ao trabalhador, isso não é nenhuma novidade, no entanto, que ela pode ensejar o direito à concessão de uma aposentadoria da Previdência Social com regras diferenciadas, mais benéficas, muitos não sabem.
É que a atividade de motorista, seja ela de ônibus, seja de caminhão, levando-se em consideração fatores como o grau tecnológico do veículo manejado; o péssimo estado de conservação das vias percorridas; a pressão pelo cumprimento de prazos e de metas; a privação do sono do condutor; a necessidade de percorrer grandes distâncias geográficas; entre outros, pode ser considerada penosa.
Para quem não sabe, penosidade é o desgaste à saúde do trabalhador ocorrido na prestação da atividade profissional, em virtude da necessidade de dispêndio de esforço excessivo, da necessidade de concentração permanente e contínua e/ou da necessidade de manutenção constante de postura.
Convém esclarecer que a penosidade era tida como apta à caracterização da atividade especial pelos Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79, tendo o Decreto nº 2.172/97, contudo, os revogados quanto ao ponto. Isso fez com que alguns julgadores entendessem que o desempenho de atividade penosa não enseja mais o reconhecimento de tempo especial após 1997. Contudo, não é esse o melhor entendimento a ser adotado.
É que o Superior Tribunal de Justiça, ao analisar o caso de um eletricista, decidiu, através do REsp nº 1.306.113/SC, que era possível o reconhecimento da respectiva especialidade, mesmo tendo sido desempenhada atividade que não consta mais nos referidos Decretos, porque comprovada a nocividade do labor prestado através de perícia técnica. Assim, o entendimento deve ser estendido a outros fatores de risco, inclusive à penosidade.
Até porque, a proteção do trabalhador no desempenho de atividades penosas possui respaldo até mesmo na Constituição da República, considerando o seu direito fundamental ao meio ambiente do trabalho hígido.
E foi com base no referido entendimento que o Tribunal Regional Federal da 4ª Região julgou o Incidente de Assunção de Competência nº 503388890.2018.4.04.0000, fixando tese sobre a matéria, admitindo a possibilidade de reconhecimento do caráter especial das atividades de motorista ou de cobrador de ônibus em virtude da penosidade, independentemente da época em que prestado o labor, desde que tal circunstância seja comprovada por meio de perícia judicial individualizada.
Portanto, desde que o segurado comprove o caráter penoso do trabalho que desempenhou, este possui direito ao cômputo diferenciado do período laborado, podendo antecipar a concessão de sua aposentadoria ou, até mesmo, majorar a sua renda mensal.
Cabe salientar que, mesmo que o trabalhador não tenha desempenhado a atividade de motorista durante a integralidade de sua vida, mas apenas em parte dela, ainda assim poderá se beneficiar do reconhecimento do tempo especial, analisando-se caso a caso.
Ademais, é importante ressaltar, ainda, que aqueles que já tiveram o benefício concedido, seja administrativa, seja judicialmente, mas desconheciam o citado direito, ainda poderão pleitear a revisão do benefício, desde que o início do pagamento não tenha ocorrido há mais de 10 (dez) anos.
Vale lembrar que a vantagem de reconhecer tempo especial em razão da exposição à penosidade deve ser analisada individualmente, caso a caso, através de simulações realizadas por profissional com conhecimento especializado sobre a matéria.
Matéria escrita pela advogada Manuela Sanches (OAB/RS 86.329) – escritório de advocacia Manuela Sanches, Consultoria e Advocacia Previdenciária (e-mail [email protected]).