Gilberto Jasper
_Jornalista/[email protected]
A demora na entrega de moradias aos atingidos pelas enchentes desde setembro de 2023 expõe duas mazelas crônicas do Brasil. Uma é a burocracia crônica que emperra qualquer iniciativa que exige “autenticação oficial” de alguma autoridade reconhecida.
Em qualquer país desenvolvido, abrir uma empresa ou transferir um veículo são rotinas cumpridas sem intermediários. É possível cumprir a burocracia, mediante o uso do computador ou de aplicativos de celular.
No Brasil, a figura do despachante é onipresente, resultado do festival de exigências justificadas na proliferação de fraudes de todo tipo. Todos parecem desonestos até prova em contrário. O trabalhador não tem tempo a perder em cartório para cumprir um sem número de etapas que causa desânimo.
Tudo isso impacta em tempo e custo e nem sempre o demandante sai da repartição com o documento, tornando-se um escravo dos prazos. No caso das enchentes o que o principalmente o governo federal não entendeu é que vivemos, no Rio Grande do Sul, uma situação excepcional de calamidade e emergência extremas.
O fortalecimento da burocracia se alimenta de outras vertentes. Uma delas, citada usualmente, é a proliferação de vigaristas que insistem na busca do dinheiro fácil em todas as circunstâncias. Poucas horas depois do trágico acidente aéreo da última sexta-feira, familiares das 62 vítimas denunciavam tentativas de golpes usando perfis dos mortos para pedir dinheiro para deslocamentos até São Paulo para reconhecimento dos corpos.
Parcela significativa dos pedidos emergenciais com benefícios à população e aos microempreendedores foi fraudada, conforme a imprensa noticia todos os dias. O vício de “conseguir dinheiro fácil”, sem trabalho ou esforço, está profundamente arraigado em nossa sociedade. Parece impossível realizar uma simples rifa sem que o registro de que ocorra uma falcatrua intrínseca. O resultado é uma desconfiança generalizada, inclusive junto às instituições tradicionais que, como reza o ditado, faz com que “os bons paguem pelos bandidos”.
Em meio desta mistura de burocracia e emprego de meios escusos/golpes, sofrem aqueles que há onze meses padecem em abrigos ou morando de favor com familiares ou amigos. Tomara que a promessa de “uma casa para cada um de vocês”, repetida à exaustão pelo presidente da república, um dia se torne realidade.