Buenas!
Setembro é marcante para todo brasileiro pois vivemos o sete de setembro, nossa data pátria. Não há quem não tenha em sua memória um desfile cívico do qual participou ou assistiu ao longo de sua existência. O desfile de 2023 será marcado como o que não ocorreu.
E, desta vez, não foi devido à pandemia, como em 2020, mas sim, devido a uma enchente que arrasou uma dezena de cidades no interior do Rio Grande do Sul, poucos dias antes do desfile. O governo não teve outra alternativa senão cancelar o périplo pátrio.
Não foi qualquer enchente ou chuva, foram cascatas torrenciais caindo do céu que elevaram o nível dos rios que, por conseguinte, arrasaram cidades inteiras, pontes quase centenárias e algumas estradas, isolando comunidades.
Pessoas com mais de 80 anos afirmaram que nunca viram nada parecido. Estudiosos dizem que a enchente só pode ser comparada com a ocorrida em 1941, que alagou até a capital gaúcha, mas que não ficou concentrada em uma única região.
Nossa geração não tem parâmetros, mas sabemos que 400 milímetros de chuva em dois ou três dias sobre uma única região tem o poder de uma bomba atômica. Talvez esteja exagerando, mas certamente um verdadeiro tsunami fluvial, tal a destruição causada pela força das águas. Casas arrancadas do alicerce e animais sobre telhados e árvores.
Neste sete de setembro, as autoridades optaram por cancelar todos os desfiles pátrios no RS. Atitude mais do que acertada, não há como comemorar, apesar da importância da data, diante de tamanha calamidade. Até o feriado, foram encontradas quase cinco dezenas de corpos, vidas que foram ceifadas pela força das águas.
Não há clima para festejos, há clima somente para a solidariedade. Não há cidade gaúcha que não esteja mobilizada para recolher doações. Milhares de famílias perderam tudo, eu disse tudo, que possuíam.
E não é o primeiro desastre do ano. Como já disse neste mesmo espaço meses atrás, o clima do planeta está sofrendo alterações, cobrando seu preço. Além da seca no início do ano, foram, ao menos, mais dois ciclones extratropicais atingindo o RS. Contudo, nem somando os dois anteriores teríamos o estrago deste último.
E não há como negar as alterações climáticas ou o aquecimento global. Cidades do norte da Europa, como Paris e Londres, tem registro de temperaturas acima de 30 graus, em pleno setembro. Enchentes assolam diversas cidades europeias. Até um deserto americano, famoso por acolher um festival musical nesta época, sofreu, vejam vocês com dilúvios fluviais nunca, eu disse, nunca antes vistos pelo homem moderno.
O sete de setembro pode esperar. Inclusive, enquanto organizo aqui roupas para doação e vou ao mercado comprar alguma cesta básica para levar aos pontos de coleta, fiz um exercício. Já que não tivemos o desfile cívico, lembrei de um que vivi.
Estava eu desfilando pela 10ª vez, agora, como aluno do NPOR, do alto dos meus 19 anos. Como estudante foram várias vezes, época em que alimentei um sonho nunca conquistado: eu nunca fui da banda do colégio, nunca toquei tarola. Sim, caríssimos leitores, carrego em mim uma frustração que nunca será superada.
Voltando aos tempos de quartel, quando usava a farda militar, meu desfile era monitorado não só por meus superiores, mas também por meus parentes. Minha mãe, irmã e avô paterno estavam lá. Quando passei marchando, concentrado, mal os vi de relance.
Não pude conversar com eles ao final do evento, pois voltei para o quartel, estava de serviço. Mas sabia que meu avô tinha levado sua máquina fotográfica para registrar, cheio de orgulho do único neto que havia entrado no quartel. Devo ter esta foto guardada em algum álbum…
No meio da tarde, sou chamado para atender o telefone. Era minha mãe, meu avô havia falecido. O susto foi grande, porém, não tanto. Não era o avô paterno, que fora ao desfile. Era o avô materno, que estava muito doente e morando em nossa casa. Diferente de uma morte inesperada, ele estava doente há meses, não saia da cama, nem para ir ao banheiro. Ele, finalmente, descansou.
A morte é inevitável e nunca deve ser comemorada. Porém, quando carrega em si uma sensação que pode ser chamada de alívio, tem seu valor. Quando é inesperada e surge como um tsunami arrasando casas e famílias que descansavam em seus lares, seu peso beira o insuportável.
A parte boa, se é que podemos ver algo de bom em uma catástrofe desse tamanho, é ver a quantidade de pessoas engajadas na única coisa que nos resta: ajudar.
As doações não param de chegar, vem de todo o estado, até de outras partes do Brasil. Voluntários estão lá, sujando as mãos para tentar limpar um pouco do entulho que dominou o que um dia foram casas, ruas e praças.
O pouco que fazemos, não irá recuperar tantas perdas materiais, que dizer as humanas. Rememorar desfiles marcantes, muito menos. Mas o apoio que puder dar para minha mãe quando perdeu seu pai em um longínquo sete de setembro, este ela não esqueceu, assim como as famílias que estão recebendo o carinho e ajuda de tantos neste momento tão difícil.
Que venham novos sete de setembros e que estejamos melhor preparados para novas enchentes. Afinal, tudo faz parte do ciclo da vida, para tanto, estejamos vivos!