Buenas!
Carnaval chegou, atravessou a passarela, com suas alas de baianas rechonchudas e de passistas ágeis, com suas levas de carros rumo ao litoral, com aglomeração de gente com pouca roupa e muita disposição para entornar hectolitros de cerveja e varar madrugadas se divertindo junto aos amigos, tanto os de longa data, quanto os conquistados no momento de êxtase coletivo chamado Carnaval.
Não é o teu caso? Prefere a solidão de uma cabana, longe da muvuca, pegar uma estrada no contra fluxo dos veículos, uma região serrana, abraçar uma árvore e beber água de uma cascata virgem? Talvez escolher uma cidade pequena, com pouca gente e muita comida, taças de vinho tinto e uma lareira crepitante, mesmo que faça 40º lá fora?
Ou, quem sabe, é daqueles que prefere a reclusão de seu lar, mesmo que seja um apartamento quarto-e-sala no centro da cidade com vista para a parede de outro prédio, com alguns livros, a tevê conectada à internet e uns dois ou três gatos sentados na tua cabeça, a única parte que não está coberta por uma manta.
Não há regras definidas para aproveitar o maior feriadão do ano – para quem não precisa trabalhar, é claro, pois tem muita gente que pega pesado no batente, continua sua labuta, pois os boletos chegam mensalmente, ignorando os feriados.
Caso não saibam, o feriado é só na terça-feira, contudo, o bom brasileiro começa a se divertir na sexta, iniciando os trabalhos efetivos a partir da tarde de quarta-feira de cinzas – caso não emende! Ou seja, no mínimo cinco dias de vagabundagem, digo, festejos e diversão…
Como citei acima, nem todos precisam fazer a mesma coisa, apesar da maioria preferir o listado no primeiro parágrafo, arrastando muitos indecisos consigo. Por sinal, vocês já foram para festas que não tinham muita vontade mas o fizeram para agradar as amizades? Na juventude, óbvio que fiz. Tu quer estar no meio dos amigos, mesmo que os amigos não sejam próximos no quesito interesses e gostos, mas colegas de colégio, quartel, faculdade…
Porém, no auge da maturidade de quem já passou dos trinta – sim, cinquentei recentemente, apesar da descrença geral da nação, mas é verdade este bilhete –, aprendi a dizer não. Não aos convites de parcerias para festas, saídas, quando não estava com vontade. Simples assim. Claro, quando se está solteiro, a pessoa é mais sujeita a aceitar tais convocações.
Porém – bendito seja o salvador e antagônico porém –, vale a pena rejeitar o pedido para ficar em casa, junto do teu eu, aquele cara que te conhece desde o berço, em troca de convites alheios para ficar em pé em bares ou boates, comendo e bebendo o que não tava muito interessado?
– E aí? Bora pular carnaval?
– Não, obrigado, vou ficar aqui com o último livro do Osho, com um vinho e com o Henrique VIII, meu gato.
– Mas o que tem de tão bom neste livro?
– Só uma frase: “se você é capaz de ser feliz quando está sozinho, você aprende o segredo de ser feliz.”
– Massa… Empresta?
Nem tenho livro dele, pesquei a frase de um post do instagram, mas a citação tem seu valor. O celular tem sua utilidade, como encontrar frases lapidares, mas tira a capacidade de concentração da pessoa.
Antes de jogar o dito cujo pela janela do décimo andar e viver como um ermitão, abandono a tela com vídeos das musas do carnaval e leio outra frase edificante: “Solitude é estar acompanhado, mas de si mesmo!” Penso um pouco mais, largo o telefone sobre a mesa, com a tela desligada, e cancelo o lançamento de celular.
O aparelho mais utilizado no mundo ajuda nos relacionamentos. Mas ele exagera, atrapalhando a mesma interação. Pode ser numa festa de carnaval com todo mundo cantando “Oh abre alas, que eu quero passar!”, na leitura de um livro ou escrever missivas aos amigos, como esta singela crônica?
Em conversa com um professor de literatura, ele afirmou que não anda lendo nada, dominado pela fugacidade que a tela do celular proporciona. E ler é o ganha pão dele! Não posso culpá-lo, eu leio, no momento, uns cinco livros! Para terminar um, só colocando o celular dentro de um cofre e dar a chave para um vizinho. E eu não tenho cofre!
Há alguma explicação para isso, afinal, a velocidade com que trocamos de assunto na tela do dito aparelho que não sai de nossas mãos é diametralmente oposta à tenacidade exigida pelas páginas de um livro, não só pela qualidade das palavras ali impressas, mas pela dinâmica estática imposta pela impressão da leitura…
Quem sabe, no próximo carnaval, deixaremos este brinquedinho de lado? Se ficar em casa, sozinho, exercer a solitude, ver um filme ou série com mais atenção ou terminar aquele livro iniciado antes da queda das Torres Gêmeas.
E outra grande vantagem, se for pular Carnaval na rua ou em clubes sem ele, poderá conversar com as pessoas que se aproximarem de ti sem desviar o olhar para a tela a cada segundo.
Além, é claro, da vantagem de não ser furtado, pois os índices, neste período, são os piores do ano!