qua, 8 de janeiro de 2025

Variedades Digital | 04 e 05.01.25

Por que agosto tem fama de desgosto?

Buenas!

Estamos diante de uma daquelas situações em que somente as crendices poderão nos salvar, ainda quando se somam a histórias divertidas; se antigas, tanto melhor. Pergunto, com ênfase curiosa: por que, cargas d’água, o mês de agosto ganhou fama tão negativa? Farei algo que me agrada muito, adentrar os aspectos históricos e anedóticos do oitavo mês do calendário ocidental. Portanto, segure-se na poltrona que a ladeira é íngreme!

Agosto recebeu este nome em homenagem ao primeiro imperador romano, César Augustus, filho de Júlio César, o mesmo que deu ordens para criar o calendário Juliano, ainda no séc. I a.C. O calendário foi alterado ao longo dos séculos, mas agosto manteve o nome imperial. Eu concordo, caríssimos e atenciosos leitores, que para saber disso bastaria uma consulta ao divino google. Entretanto, o meu questionamento se atém às motivações deste mês ter fama tão negativa. Não será por marcar o inverno no hemisfério sul e tampouco o auge do verão no norte. Mesmo assim, contra efemérides, não há argumentos. Contudo, “argumentar é vida!”, dizia eu desde criança, muitas vezes, diante do ameaçador chinelo materno.

Voltemos à fama negativa de agosto, que é o que nos trouxe aqui. A reputação negativa vem de longa data. Durante o período das grandes navegações, os portugueses não se casavam no mês de agosto, afinal, era o melhor período para se lançar “aos mares nunca dantes navegados”, segundo Camões. Crendices populares de então diziam que “casar em agosto traz desgosto”. Com isso, “muitas noivas ficaram por casar, para que fosses nosso, ó mar”, como nos disse o genial Fernando Pessoa no poema “Mar Português”.

Ou seja, não se casava em agosto em Portugal devido ao fado das incertezas, pois metade dos homens que embarcavam não voltavam à terrinha: ou morriam pelo caminho ou se engraçavam com as nativas, tanto no Brasil, quanto nas Índias. Fado, para evitar nova consulta, não é o estilo musical melancólico lusitano, mas sim, o destino!

Para completar o desdito luso, foi em Agosto de 1554 que o rei Dom Sebastião I desapareceu em uma batalha em terras africanas. Até hoje a data é lamentada pelos patrícios de além-mar. Sumidades literárias como o padre Antônio Vieira no séc. XVII e o poeta Fernando Pessoa no início do séc. XX, contribuíram para a consolidação de lendas cantadas em prosa e verso de que ele não morreu e um dia voltará, alçando Portugal à glória de outrora.

Em terras brasileiras, tal fama gracejou tanto quanto a língua portuguesa, agora adaptada aos trópicos. Como somos deveras criativos, agosto ganhou a alcunha de “mês do cachorro louco”, sabiam? Alguns dizem que é devido ao período fértil das cachorras, “enlouquecendo” os cães, mas aí entram os exageros populares.

Por aqui, foi em 24 de agosto de 1954 que Getúlio Vargas cometeu suicídio, “saindo da vida para entrar na história”, segundo suas próprias palavras. Em 1961, Jânio Quadros, pressionado por “forças ocultas”, renunciou à presidência, na esperança de ser alçado novamente ao poder pelos braços da população. Para sua tristeza, foi prontamente esquecido. Na sequência, ainda no mesmo mês, Leonel Brizola iniciou o movimento da “Legalidade”, visando garantir a posse do vice-presidente João Goulart, que estava em viagem à China.

Foram quase duas semanas de resistência e ameaças de bombardeios ao palácio Piratini, sede do governo do Rio Grande do Sul. Tal ato de coragem deu sobrevida de quase três anos ao governo democraticamente eleito, até o famigerado golpe de 1964, que ocorreu em 1 de abril. Viram? Uma exceção deslocada no calendário, imprescindível para comprovar a regra de que agosto é o mês do desgosto…

Como efeméride marcante, é impossível esquecer que foi neste mesmo mês que teve início a I Grande Guerra Mundial, em 1914, e, infelizmente, foi escolhido pelos americanos para lançar as bombas nucleares sobre Hiroshima e Nagasaki, em 1945, as únicas arremessadas sobre populações civis e inocentes desde a criação de arma não nociva, um verdadeiro crime cometido contra a humanidade.

Perdemos nesse mesmo mês, ao longo dos séculos, personalidades marcantes da humanidade, como Elvis – recomendo com ênfase assistirem o filme lançado recentemente -, Juscelino Kubitschek e Lady Diana, ambos em trágicos acidentes de carro, dentre outros tantos.

Contudo, não temos somente coisas ruins. Nasceram neste mesmo mês gente com a grandeza de um Napoleão Bonaparte e de um Barack Obama, além de músicos renomados, como Caetano Veloso. Ele completou, ainda agorinha, 80 agostos, sempre esbanjando criatividade.

Para encerrar, uma sugestão de alguém nasceu logo em seguida, o setembrino Caio Fernando Abreu: “Para atravessar agosto ter um amor seria importante, mas se você não conseguiu, se a vida não deu ou ele partiu – sem o menor pudor, invente um.”

Viram? Com uma pitada de amor, seja real ou fictício, não há desgosto, muito menos agosto, que seja insuperável…

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