Buenas!,
Acabou a celeuma mais debatida dos últimos meses: o voto continuará a ser digital, sem impressão de papel. Não quero entrar no mérito do que é o melhor ou pior neste momento, mas gostaria de meter minha colher no que interessa: como se vota no Brasil ao longo dos tempos.
Afinal, o debate gerou tanta polêmica, os contendores despenderam tanta energia nas redes sociais que, se o povo que defendeu o papel e o que bateu pé no virtual, tivesse pegado uma enxada e fosse plantar alface, teríamos superávit por alguns anos deste tão importante produto para a subsistência humana.
O voto sempre foi complicado no Brasil, não seria no século XXI que seria diferente. Desde o início da República, tivemos brigas. Lembram da política do café com leite? Por mais de trinta anos, candidatos representando os ricos estados de São Paulo, mantido pelas plantações de café, e de Minas Gerais, sustentado basicamente pelo gado leiteiro, alternavam-se no poder, localizado no Rio de Janeiro. Com isso, ganhavam maiores verbas e dominavam a política econômica do país.
Um dos absurdos de então era o voto não ser secreto, fazendo com que os chamados coronéis, que eram fazendeiros do interior, obrigassem seus funcionários a votar em quem eles quisessem, criando o chamado “voto de cabresto”. Existem urnas em museus com fundos falsos, por onde eram introduzidos votos previamente preenchidos.
Aqui no RS, Borges de Medeiros manteve-se no poder por trinta anos de forma quase ininterrupta, sendo “apeado” do cargo pela revolução federalista de 1923. Mesmo assim, a partir de acordo assinado no tratado de Pedra Altas, só saiu da cadeira em 1928, quando passou o cargo para Getúlio Vargas.
Falando nele, o golpe de 1930, que levou os gaúchos a amarrarem os pingos no obelisco da avenida Central, no Rio de Janeiro, só ocorreu porque o caudilho e seus aliados alegaram que as eleições foram fraudadas. Aliás, este ato só deu certo porque os mineiros apoiaram Getúlio, após serem traídos pelos paulistas, que romperam com o acordo da alternância de poder entre eles.
Com o passar do tempo, a eleição foi mudando. Sabiam que Jango, o gaúcho deposto no golpe militar de 1964, foi eleito duas vezes como vice-presidente, primeiro do JK, e depois do Jânio Quadros? Naqueles tempos, o vice era eleito separadamente, podendo, inclusive, ser de partido contrário ao titular da pasta. Suprema das ironias, Jango foi apoiado pela maioria da população, pois ganhou mais votos como vice do que JK para ser presidente. Porém, alguns anos depois, seria deposto por uma parcela da população e uma leva de militares…
Por causa deste evento tão conhecido, meu pai e seus contemporâneos só puderam votar para presidente quando eu me tornei eleitor. Corria o saudoso ano de 1989, transcorreu um século desde a proclamação da República e vinte e nove anos da última eleição direta presidencial. Lembro até hoje quando eu, do auge dos meus dezesseis anos, empunhei com orgulho meu título eleitoral, objeto conquistado com extrema dificuldade por meu pai. Meu avô, apesar dos tempos sombrios, tentou ser vereador na época em que a política era dividida entre Arena e MDB.
Sei que não precisaria explicar, mas penso ser importante demarcar território. Por óbvio, meu avô envergava a bandeira do partido contrário à ditadura. Aprendi com ele que não devemos aceitar regimes totalitários. Diariamente, após aposentado da viação férrea (esse crime, o fim das linhas de trem no Brasil, ainda receberão minha atenção, aguardem!), ele abria e mantinha funcionando o escritório do seu partido na cidade.
Sob influência desta mesma liberdade que ele pregava, não votei em seu candidato, Ulysses Guimarães, que presidira a assembleia constituinte. Votei em Leonel Brizola, pois desconsiderei os seus defeitos e valorizei a bandeira que ele bradava com ênfase: educação qualificada para os jovens!
Eu, já na tenra adolescência, sabia que sem educação nenhum país sairia do buraco. Ele, seguindo idéias de Darcy Ribeiro, um dos maiores homens que este país já viu nascer, criou os CIEPs, que eram escolas de turno integral. Infelizmente, não vingaram no Brasil. Nenhum dos dois elegeu seu candidato, tivemos de engolir o famoso caçador de marajás, que renunciou após um processo de impeachment. Lembro de meu avô, por trás de seu suntuoso bigode, afirmar antes das eleições, que este tal de “collorido” não era sério. Pena que nem todos pensaram assim…
Do mesmo modo, muita gente pensa diferente hoje em dia, ainda mais quando fomentadas pelas todo-poderosas redes sociais. Basta ver a bagunça que o derrotado Trump fez nos EUA após a eleição. Colocou em dúvida o sistema eleitoral, levando um bando de insanos a invadir o Congresso Nacional, em Washington. Seu discurso tresloucado tirou a vida de cinco pessoas e deixou dezenas de feridos. Após uma desgastante recontagem, provou-se que suas ameaças e dúvidas quanto à lisura do pleito eram mera falácia de perdedor.
Agora que, finalmente, definimos o sistema da próxima votação por estas bandas, podemos partir para o que interessa: baseado nos exemplos históricos que listei e no conhecimento do quão difícil foi reaver o direito ao voto, não devemos nos ater em como votar, mas sim, em quem.
Para encerrar, dou uma dica e não irei cobrar nada por ela (aproveitem, não é sempre que estou bonzinho): análise de curriculum. Uma empresa, quando contrata um funcionário, confere o que ele fez, não o que ele diz que irá fazer. De promessas vazias e conversa mole nossa política tá dando show. Tá na hora de nossos funcionários – sim, os governantes são funcionários do povo – mostrarem um pouco mais de serviço!