Buenas,
Há mais de meio ano estamos travando uma luta árdua para nos adaptar aos tempos difíceis apresentados por esta inusitada pandemia. Nos últimos cem anos, nada parecido surgiu no planeta. Tivemos duas grandes e quentes guerras, bombas nucleares, guerras frias, guerras civis, fome, massacres, entre outras mazelas que mataram milhões, mas nada com a abrangência e invisibilidade desse vírus.
Nos últimos meses, apesar do confinamento, mais de um milhão de vidas foram ceifadas, infelizmente. Muitos ainda irão morrer; o vírus não escolhe classe social, cor ou credo, apesar de ser mais nocivo às classes menos abastadas, conforme as mais recentes pesquisas. E a principal recomendação dos órgãos de saúde é: usem máscaras, mantenham as mãos limpas e mantenham o isolamento social ou, pelo menos, um distanciamento seguro.
Pensando nisso, fiquei curioso sobre o efeito do confinamento nos relacionamentos afetivos: o seu sobreviveu? Ficou mais forte? Quem estava mais ou menos, consolidou? Ou, pior, tudo desandou e agora está cada um por si? E os solteiros, como sobreviveram?
Muitos conseguiram adaptar-se ao namoro virtual, utilizando as chamadas por vídeo. Porém, nem todos se adequaram a essa modernidade, como eu. Por isso, fiquemos com as pessoas de carne e osso e suas interações.
É um assunto muito em voga, sabiam? Já ouvi relatos de várias vertentes. Em um dos casos, uma amiga minha quer o divórcio, não aguenta mais seu parceiro. Eles são casados, tem duas filhas e a pandemia fez uma maldade com o casal: obrigou-os a conviver muito mais que o usual. Qual o resultado disso? Conhecimento do adversário! O contato excessivo causado pela proximidade que antes era esporádica devido ao casamento, propiciou que passassem muito mais tempo um com o outro.
Não devia ser assim, mas é. Antes do casamento, as pessoas querem estar juntas o tempo todo. Depois do ato consumado, o trabalho, filhos, afazeres domésticos, em suma, a rotina, só os aproxima no leito nupcial para a busca de um sono profundo, não para as saudosas atividades tão almejadas no início do relacionamento.
No caso deles, seis meses de pandemia, mesmo com ambos trabalhando fora em alguma parcela do tempo, tornou a proximidade “demasiada”. Filhos fora da escola, TV ligada ininterruptamente, marido sempre no celular, não ajuda em nada, o cretino, e ainda usa a clássica desculpa que está trabalhando. É um caos, diz ela, resta somente o divórcio. Não sei se consumou; a última vez que obtive notícias, ainda estavam em negociações…
Outro amigo, esse solteiro convicto, estava apavorado, sofrendo de abstinência de contatos imediatos de 3º grau com o sexo oposto. Boa pinta, quarentão, bem de grana, não queria saber de relacionamentos sérios, estava surfando na onda dos bares noturnos e dos aplicativos. Esfregava na cara dos amigos suas mais recentes e jovens conquistas, causando inveja no time dos casados. Eis que durante a pandemia, nem as festas aconteciam, nem os aplicativos estavam facilitando a aproximação, tal a preocupação com o contágio. Afinal, quem vê cara não vê teste negativo para o Covid-19.
Como ele se virou? Sofreu por um período e acabou apelando, no bom sentido. Retomou as negociações com um antigo contatinho: ele sempre arrastou uma asa por ela, mas nunca quis admitir. Papo vai, papo vem, virtualmente falando, apresentaram testes negativados desse maldito vírus e começaram um affair, repetindo a expressão usada por ele.
E não é que engrenaram? Estão felizes, nenhum em busca de novas aventuras, valorizando o que descobriram juntos e um no outro, após se permitirem. Torço para que depois da flexibilização do isolamento mantenham a linha, sem recaídas digitais!
Em outro caso, um casal estava em pleno namoro há mais de um ano quando veio a pandemia. Eram acostumados a passeios em cinemas, cafés e viagens das mais diversas. Sempre que podiam, botavam o pé na rua e malas na esteira. Eis que foram obrigados a ficar em casa, claro, nas respectivas folgas, pois o trabalho os levava as ruas: um era da área da saúde, outro da segurança, profissionais que não pararam muito.
Quando sobrava tempo, não podiam dar vazão ao seu instinto de navegadores. E as passagens compradas, as reservas feitas? Tudo suspenso por tempo indeterminado, para frustração geral da nação… Tiveram que manter-se aterrados, porém, nenhum dos dois poderia saber o que resultaria das horas de folga atiradas no sofá, vendo séries, filmes ou consumindo livros. Não é que não gostassem de fazer isso, mas ficar “somente” com essas opções, poderia ser sinônimo de acomodação, palavra riscada do dicionário de ambos desde o berço!
Eis que, para surpresa de ambos, encontraram prazeres diferenciados na convivência agora excessiva entre os dois. Estar juntos, ao contrário de ser nocivo, trouxe cada vez mais intimidade. Chegaram ao ponto de confessar-me que, quando precisavam trabalhar, a saudade um do outro tomava conta deles, inclusive do sofá e da disputa acirrada pelo controle remoto…
De uma certa maneira, todos fomos vítimas do vírus: muitos pereceram, outros ficaram com sequelas físicas, alguns com problemas psicológicos, mesmo não se contaminando. Nunca podemos esquecer que somos humanos e vulneráveis, menos ainda negligenciar que dependemos um do outro. Não importa se solteiros ou casados, cultivar bons relacionamentos afetivos é a melhor das vacinas para esses momentos bicudos!