Gilberto Jasper
Jornalista / [email protected]
Tenho muitos amigos que demonstram disposição em doar órgãos depois da morte. Isso contradiz as estatísticas que revelam a crônica falta de doadores para salvar vidas em inúmeros hospitais país afora. Na maioria dos casos a doação não se concretiza porque existe grande resistência dos familiares, obrigados a decidir na hora mais dolorosa.
Repito à família que gostaria de ajudar ao “partir desta para uma melhor”. No caso das córneas, certamente haverá restrições porque minha miopia foi corrigida há mais de 20 anos pela habilidade do oftalmologista Sérgio Prinz, de quem sou paciente até hoje, mas hoje, devido à idade avançada, há outros problemas.
O fígado desperta sérias dúvidas. A quantidade de cerveja BellaVista consumida na pandemia – a mãe de todas as culpas! – pode ter comprometido este órgão de vital importância para o ser humano. Comecei a beber relativamente tarde, aos 23 anos, quando morei em Santa Cruz do Sul, capital brasileira da cerveja e terra da Oktoberfest. Talvez este tempo de prática do “alterocopismo” – o esporte de levantamento de copos – possa impedir a doação, mas mantenho a esperança.
O coração vai muito bem obrigado. Talvez seja o órgão que mais exercitei ao longo da vida porque amigos, familiares e afetos em geral são vitais na minha rotina. Já escrevi aqui – e no meu livro “O Tempo é o Senhor da Razão e Outras Crônicas” – que mantenho extrema dificuldade para deletar o contato de amigos que já partiram. Na hora de apagar o nome na agenda do celular um filme passa pela cabeça, com histórias, episódios e convivências que ficarão para sempre na alma e no coração.
O rim, considerado o filtro do corpo humano, foi submetido há décadas de “dieta do chimarrão”. Junto à leitura de jornais e do radinho de pilha é meu parceiro inseparável logo de manhã cedo, não importa a temperatura. Em Cancún, Punta Cana ou Natal chama a atenção com a inevitável pergunta:
– Gaúcho… tá fazendo 40 graus na sombra e você não larga este copo gigante com água fumegante? – indagam sempre diante da minha cuia.
O pulmão está saudável. Jamais fumei, embora seja filho de tabagistas. Lamentei profundamente que minha mãe tenha contraído câncer em decorrência do hábito. No meu caso, o ponto negativo é o fato de não praticar esportes, sequer caminhar. O único exercício são aulas semanais para minimizar as mazelas de uma hérnia de disco.
É possível salvar alguma parte do meu corpo para ajudar alguém quando se referirem a mim como “ele era tão bom”. Amigo leitor: não interprete esta crônica como fatalista, fúnebre ou pessimista. É apenas um apelo para estimular as doações. E salvar muitas vidas!