Assunto que envolve pautas como segurança, saúde pública e impactos no meio rural e urbano preocupa a Rural de Sant’Ana do Livramento e forças policiais da fronteira do Brasil e Uruguai
Seguindo a sequência de encontros propostos pela Associação e Sindicato Rural de Sant’Ana do Livramento, a fim de estabelecer ações efetivas contra o abigeato na zona de fronteira entre Sant’Ana do Livramento e Rivera, foi realizada mais uma reunião na manhã da segunda-feira (27), no Parque da Rural.
Neste encontro fechado, o propósito foi de unir as forças policiais, produtores rurais e as entidades representativas do setor das duas cidades para a criação de estratégias e alinhamento das ações efetivas no combate ao furto de animais nas propriedades. Além de reunir demandas que serão apresentadas pelo Sindicato Rural, juntamente com a FARSUL, em reunião com o vice-governador e secretário da Segurança Pública, Ranolfo Vieira Júnior, no dia 5 de fevereiro, em Porto Alegre.
Anteriormente foram realizadas outras reuniões isoladas com os produtores rurais lesados pelo crime de abigeato, órgãos políticos dos dois países e autoridades militares com o objetivo de criar um elo entre todas figuras envolvidas. “Queremos defender o trabalhador rural, o produtor”, enfatizou o presidente da Associação e Sindicato Rural de Sant’Ana do Livramento, Luis Carlos D’Auria Nunes.
Além de ser uma questão que preocupa pelo caráter financeiro e de segurança, o abigeato conta com um agravante que afeta não só quem trabalha e tira o seu sustento do campo: é um crime de saúde pública. Por se tratar do consumo e comercialização da carne de animais roubados, acarreta no abate ilegal, armazenamento inadequado e venda imprópria. Tudo isso sem nenhuma fiscalização sanitária, fazendo com que a carne provinda do abigeato e consumida pela população seja foco de inúmeras doenças.
Segundo Delegado André Mendes, da Delegacia de Polícia Especializada na Repressão aos Crimes Rurais e Abigeato (DECRAB-BAGÉ), a integração entre os envolvidos é a chave para que os casos sejam solucionados e os índices de crimes diminuam, como a importância do registro da ocorrência por parte do produtor rural. E ainda ressaltou a importância da atuação das Associações e Sindicatos nesta ação: “Toda a forma organizada, que se propõe a uma finalidade, ela colabora. O Sindicato se organizando, fazendo uma rede de contatos direta com o produtor e pressionando as autoridades que precisam ser pressionadas e fazendo parte deste processo, permite que as forças policiais e de fiscalização também possam realizar seus serviços de uma forma mais produtiva. E isso tudo é o que têm demonstrado resultados nas cidades onde atuamos”.
Entre os presentes também estavam os senhores Atanásio Rodrigo (Sociedade Fomento Rural de Rivera), Júlio Armand Ugon (Federação Rural do Uruguai) o TenCel Otero (Comandante do 2°RPMon), Paulo Ricardo Dias (representante da FARSUL), produtores rurais afetados pelos crimes de abigeato e representantes das forças policiais de Brasil e Uruguai.
Entrevista com André Matos
O delegado André de Matos Mendes, da Delegacia de Polícia Especializada na Repressão aos Crimes Rurais de Bagé (Decrab/Bagé), que aproveitou a oportunidade para compartilhar informações relevantes sobre o trabalho realizado nos últimos dois anos pela força tarefa da Polícia Civil.
Durante a fala do delegado André na reunião, ficou claro que a maneira mais eficaz de combater essas organizações criminosas é a união de todos os setores que são lesionados por este tipo de crime. “Nós precisamos trazer para a mesa de discussão várias entidades e vários órgãos para trocar ideias e experiências. Conversar sobre aquilo que deu certo e o que não deu. E a partir daí, traçar as estratégias para ação propriamente dita, que graças a Deus vem nos rendendo dados positivos” destacou.
Conforme o delegado, a ação das 4 delegacias especializadas contribuiu para a diminuição dos índices de crimes rurais de 2016 para cá, quando foi o marco inicial da atuação da força tarefa, passando em 2018 para a instalação efetiva das delegacias com sede própria. “Então de 2016 para cá nós reduzimos os índices de abigeato no Rio Grande do Sul em 48% e isso significa mais de 5 mil ocorrências que foram evitadas por força da investigação. E, claro, se a gente analisar o Estado de 2016 para cá, uma das únicas providências marcantes que a Polícia Civil adotou foi a criação de uma força tarefa de investigação aos crimes rurais. Essa ação permitiu por exemplo que essas quadrilhas fossem investigadas a fundo e que a polícia enxergasse o problema de uma forma mais complexa e pudesse dar a solução através dessas investigações qualificadas”.
Crime organizado invade o campo
Segundo o delegado André Mendes, as investigações da Decrab/Bagé, apontam que os grupos criminosos estão cada vez mais organizados e audaciosos onde muitas quadrilhas migraram as suas ações também para o campo. “Essas quadrilhas, às vezes, estão ligadas até grupo criminosos como facções que têm atuação no Rio Grande do Sul, principalmente no tráfico de drogas, mas identificaram no campo as facilidades que ele oferece que na maioria dos casos são locais distantes, com pouca comunicação e difícil acesso. Eles aproveitam essas características para cometerem as suas ações criminosas. Então, frente esses fatos, o Estado acabou também se organizando para dispor mecanismo de defesa porque a gente sabe que não é fácil para as delegacias locais fazerem este tipo de trabalho porque a criminalidade está cada vez mais complexa nas cidades. Então, ter um grupo especializado que possa alcançar essas cidades e fazer uma investigação com foco específico no abigeato, com certeza, alcança um resultado bem mais significativo e assim oferecer ao produtor rural um pouco mais de paz e segurança para que ele possa trabalhar”
Integração com países vizinhos
O delegado salienta ainda que em um estado como o Rio Grande do Sul é fundamental, o trabalho de integração com as policias uruguaias e argentinas, quando o assunto é crime rural. “Nós somos pioneiros neste tipo de Delegacia em nosso país. Então, nós precisamos reunir todas as faces do problema. Aqui, em Livramento, por exemplo, nós falamos de mais de 200 km de fronteira seca com o Uruguai e a gente não tem como trabalhar sem ser de forma integrada com a polícia uruguaia. E estendendo essa questão de fronteira temos também a polícia argentina com quem já fizemos diversas parcerias. Porque a gente sabe que existe vários crimes que começam num lado da fronteira e terminam no outro. Então, poder ter essa conversa e troca de informações, elas ajudam a gente a poder trabalhar e identificar esses grupos que, às vezes, são de uma cidade e atacam em outra. Neste sentido, nós estamos no caminho certo, na semana passado, por exemplo, tivermos uma importante apreensão de bois furtados no Uruguai que foram encontrados no Brasil e a prisão dos criminosos só foi possível pela ação da polícia uruguaia” destacou em entrevista.
Matias Moura | [email protected]