Edição de 1946 da Revista do Globo elencou “normas de comportamento” para pretendentes daquela época
Nos atuais “tempos modernos”, eivados de distopias, especialmente no que se refere ao comportamento de alguns adultos, e muitos jovens, esperar atenção e delicadeza na observação de regras de etiqueta talvez seja exigir demais. Embora, no passado, certas condutas tenham sido adotadas com exemplar êxito, tudo indica que o individualismo, agora reinante, já não comporta, infelizmente, um mínimo de boa educação. Uma reportagem da Revista do Globo, de 12 de outubro de 1946, nos oferece uma boa referência das preocupações de então. Diz a matéria:
“A conduta social deve se refletir na conversação, nos gestos e, de um modo geral, nas ações de cada um. Uma simples palavra que destoe ou um gesto menos dominado, muitas vezes, são o bastante para determinar mal-entendidos nas relações sociais. Cultivar as boas maneiras traz em si um duplo valor. Por um lado, encanta e conquista a amizade dos que nos rodeiam. Por outro lado, ajuda-nos a conseguir aquilo que outros, justamente por ignorar a etiqueta, jamais poderão alcançar. Seguir um código de conduta resulta em múltiplas vantagens, tanto para os homens como para as mulheres. É um modo de elevar a educação, e esta não distingue sexo.
Quando o homem deve tirar o chapéu? Na rua, a quem cabe a iniciativa do cumprimento? Tirar o chapéu é uma das mais elementares demonstrações de gentileza do homem. Esse gesto é indicado em inúmeras circunstâncias. Por exemplo: no ato de devolver um objeto que tenha caído no chão. Indispensável também ao ceder o lugar no bonde ou em qualquer outro veículo coletivo. Quanto ao cumprimento, este deve partir da moça. De que lado deve o homem caminhar na calçada em companhia de uma dama?
A regra é tão antiga quanto atual: o cavalheiro reserva sempre o ‘lado de dentro’ para a moça, no sentido de protegê-la. Proteção talvez excessiva, mas de bom tom. Atenção: sem puxar pelo braço e sem palmadinhas no ombro, entenderam? Quem deve saltar primeiro do automóvel? De qualquer veículo, sempre o homem. Até porque ele deve ajudar a dama. Sem segurar a mão da moça o cavalheiro estende a sua para que ela possa apoiar com segurança seu cotovelo na mão dele. No restaurante, quem encomenda os pratos? O rapaz, é claro! Isso após discutirem discretamente suas preferências. Escolhida a mesa, a dama aguarda, em pé, o rapaz empurrar a cadeira enquanto ela senta. É correto colocar os cotovelos sobre a mesa? Jamais! Não há necessidade disso. Pode recusar uma repetição? Você não é obrigada a se empanturrar contra a vontade.
Qual presente deve a moça aceitar do rapaz com quem não tem compromisso? O presente é sempre ‘uma revelação’. Cuidado, muito cuidado. Joias, ou qualquer roupa íntima (meias, por exemplo), em hipótese alguma. Quando muito, lenços. Livro, é fino e útil. Flores, lírico, e por isso mesmo pouco perigoso. Deve a moça telefonar ao rapaz com quem passeou no dia anterior? Esse é um ponto de máxima atenção. Qual o modo mais rápido de perder um namorado? Por incrível que pareça: ‘telefonando ao rapaz’. É quase certo que os homens não gostam de ‘perseguição’. Melhor esperar.
Deve a moça agradecer ao rapaz, pelo fato de haver tido um companheiro no seu passeio? Sim, este agradecimento não pode deixar de ser feito. Fórmulas convencionais, tipo: ‘obrigado por ter saído comigo’, devem ser evitadas. Há infinitas maneiras de exprimir o sentimento de gratidão. Detalhe: o jovem não deve ser importuno, prolongando a conversa na porta ou portão. Se a companhia foi boa, isso não significa que se vá prendê-la a mais não poder. Não custa esperar pela outra vez…”
É certo que, com o passar do tempo, a gente quer que tudo mude e evolua. Sem a formalidade (hipocrisia?) do passado, as relações podem ser mais francas e sinceras. As mudanças só não precisam ser, necessariamente, rumo ao desrespeito. O ruim sempre será pior. É ou não é?
Fotos: Ed Keffer; Interpretação: Pola Laes e Paulo Oliveira
Fonte GauchaZH